Quando terminei de colocar minhas roupas no velho guarda-roupa de pinho, peguei
minha bolsa de produtos de beleza e fui ao banheiro comunal para me lavar depois do
dia de viagem. Olhei para meu rosto no espelho enquanto penteava meu cabelo
embaraçado e úmido. Talvez fosse a luz, mas eu já parecia mais pálida, pouco saudável.
Minha pele poderia ser bela - era bem clara, parecia transparente - mas tudo dependia da
cor, e eu não tinha isso.
Encarando meu reflexo pálido no espelho fui obrigada a admitir que estava mentindo
para mim mesma. Não era só fisicamente que eu nunca me encaixaria. E seu eu não
conseguia achar um lugar para mim numa escola com três mil pessoas, quais eram
minhas chances aqui?
Eu não me relacionava bem com pessoas da minha idade. Talvez a verdade fosse que eu
não me relacionava bem com as pessoas, ponto. Até minha mãe, que era a pessoa mais
próxima de mim no planeta, nunca estava em harmonia comigo, nunca estávamos
exatamente de acordo. As vezes imaginava se eu via as mesmas coisas através de meus
olhos que o resto do mundo via com os deles. Talvez houvesse um problema no meu
cérebro. Mas o motivo não importava. O que importava era o resultado. E amanhã seria
só começo.
Não dormi bem naquela noite, mesmo depois de ter chorado tudo que precisava. O
barulho constante da chuva e do vento no telhado não saiam da minha mente. Puxei a
coberta desbotada sobre minha cabeça e depois adicionei o travesseiro também. Mas
não consegui dormir até depois da meia-noite, quando a chuva finalmente diminuiu para
um chuvisco.
Cerração fechada era tudo que conseguia ver pela minha janela de manhã, e pude sentir
a claustrofobia começado. Não se podia ver o céu aqui, era quase uma jaula.
O café-da-manhã com Charlie foi um evento silencioso. Ele me desejou boa-sorte na
escola. Eu agradeci, sabendo que as esperanças dele eram inúteis. Boa-sorte tinha a
tendência de me evitar. Charlie saiu primeiro, indo para o posto policial que era sua
esposa e família. Depois que ele saiu, sentei à velha mesa quadrada em uma das três
cadeiras que não combinavam entre si e examinei sua pequena cozinha, suas paredes
com painéis escuros, armários amarelo brilhante, e piso de linóleo branco. Nada
mudara. Minha mãe pintara os armários dezoito anos antes na tentativa de trazer alguma
luz para a casa. Sobre a pequena lareira, na sala do tamanho de um lenço que ficava
logo ao lado da cozinha, havia uma fileira de fotos. A primeira era uma do casamento de
Charlie e minha mãe em Las Vegas, uma de nós três no hospital quando eu nasci, tirada
por uma enfermeira prestativa, seguida de uma procissão de fotos escolares minhas até o
último ano. Essas eram embaraçosas de se ver - teria que ver se convencia Charlie a
colocá-las em outro lugar, pelo menos enquanto eu estivesse morando aqui.
Era impossível, estando nessa casa, não perceber que Charlie nunca tinha superado
minha mãe. Isso me fazia ficar desconfortável.
Eu não queria chegar cedo demais na escola, mas não podia ficar mais na casa . Vesti
meu casaco - que me fazia sentir como numa roupa anti-nuclear - e sai para a chuva.
Ainda chuviscava, mas não o suficiente para me molhar muito enquanto procurava pelas
chaves da casa que sempre ficavam escondidas nas plantas perto da porta e a trancava.
O barulho das minhas novas botas à prova d'água era irritante. Sentia falta do barulho
normal de cimento quando caminhava. Não pude parar para admirar minha nova
caminhonete como queria. Estava com pressa para sair da névoa molhada que rondava
minha cabeça e se grudava no meu cabelo por baixo do capuz.
Dentro da caminhonete estava seco e bom. Obviamente, Billy ou Charlie tinham
limpado o carro, mas os assentos ainda cheiravam vagamente à tabaco, gasolina e
menta. O motor ligou rápido, para meu alívio, mas bem alto, ganhando vida
ruidosamente e então chegando ao volume máximo. Bom, uma caminhonete velha
assim tinha que ter um defeito. O rádio velho funcionava, uma vantagem que eu não
esperava.
Achar a escola não foi difícil, apesar de nunca ter estado lá antes. Ela ficava, assim
como a maioria das coisas, bem perto da estrada. Não era obviamente uma escola, foi o
painel, onde dizia "Escola de Forks", que me fez parar. Parecia uma coleção de casas
geminadas, construídas com tijolos marrons. Havia tantas árvores e moitas que não
pude perceber seu tamanho logo no início. Onde estava a aparência de lugar público?
Me perguntava nostalgicamente. Onde estavam as cercas e os detetores de metais?
Estacionei em frente ao primeiro prédio, onde havia uma pequena placa que dizia
"secretaria". Não havia mais carros estacionados ali, então tive certeza de que era
proibido, mas decidi que pegaria instruções lá dentro ao invés de ficar andando em
círculos na chuva como uma idiota. Saí a contragosto da caminhonete quentinha e fui
por um caminho de pedra circundado por uma sebe escura. Respirei fundo antes de abrir
a porta.
Lá dentro estava bem iluminado e bem mais quente do que imaginava. A secretaria era
pequena, com uma pequena sala de espera com cadeiras dobráveis, carpete laranja,
avisos e prêmios abarrotados pelas paredes e um grande e ruidoso relógio. A sala era
partida ao meio por um grande balcão, cheia de cestas de arame repletas de papéis e
anúncios coloridos colados na parte da frente. Havia três mesas atrás do balcão, uma
delas ocupada por uma mulher ruiva e grande, usando óculos. Ela vestia uma camiseta
roxa, que imediatamente me fez sentir com roupas demais.
A ruiva olhou para mim. — Posso ajudá-la?
— Sou Lali Espózito — informei-lhe, e vi seus olhos demonstrarem reconhecimento
imediato. Eu era esperada, tópico de fofocas, com certeza. A filha da ex-mulher do
chefe de polícia finalmente retorna à casa.
— Claro — ela disse. Ela percorreu uma pilha precária de documentos em sua mesa até
achar os que procurava. — Seu horário está aqui, e um mapa da escola. — Ela trouxe
várias folhas até o balcão para me mostrar.
Ela me ditou todas as minhas aulas, mostrando-me no mapa a melhor maneira de chegar
até elas, e me deu um papel para que todos os professores assinassem, que deveria trazer
de volta no fim do dia.
Ela sorriu para mim e desejou, como Charlie, que eu gostasse de Forks. Sorri de volta
da maneira mais convincente possível.
Quando cheguei de volta na caminhonete, outros alunos começavam a chegar. Fui atrás
do tráfego, contornando a escola. Fiquei feliz ao ver que a maior parte dos carros eram
velhos como o meu, nada muito chique. Em casa eu morava num dos poucos bairros de
classe baixa que estavam incluídos no Distrito Paradise Valley. Era comum ver um
Mercedes ou Porsche novo no estacionamento dos alunos. O carro mais legal aqui era
um brilhante Volvo, que se sobressaia. Mesmo assim, logo que estacionei desliguei o
motor, para que o barulho enorme não chamasse atenção para mim.
Olhei para o mapa na caminhonete, tentando memorizá-lo agora, esperando que não
fosse precisar andar com ele colado no nariz o dia todo. Enfiei tudo dentro da mochila,
coloquei a alça sobre o ombro e respirei bem fundo. "Posso fazer isso", menti muito mal
para mim mesma. Ninguém ia me morder. Eu finalmente exalei e sai do carro.
Fiquei com o rosto coberto pelo capuz enquanto caminhava até a calçada, cheia de
adolescentes. Meu casaco preto e simples não se destacava na multidão, percebi com
alívio.
creditos : QA
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