quinta-feira, 9 de junho de 2011

2º Cap - Crepúsculo

Charlie me deu um abraço meio estranho, de um braço só, quando sai tropeçando do
avião.
— Bom te ver, Lali. — ele disse sorrindo, enquanto automaticamente me segurava
para eu não cair. — Você não mudou muito. Como vai Renée?
— Mamãe vai bem. É bom te ver também, pai. — ele não me deixava chamá-lo de
Charlie.
Só tinha trazido algumas malas. A maior parte das roupas que usava no Arizona eram
muito permeáveis para usar em Washington. Minha mãe e eu tínhamos nos juntado para
suplementar meu guarda-roupa com roupas de inverno, mas ainda tinha pouca coisa.
Coube tudo na mala do carro-patrulha, facilmente.
— Achei um bom carro para você, bem barato. — ele anunciou quando já estávamos no
carro.
— Que tipo de carro? — achei suspeito a maneira como ele disse "carro bom para
você", ao invés de só "carro bom".
— Bem, na verdade é uma caminhonete, um Chevrolet.
— Onde o achou?
— Lembra-se de Billy Black, de La Push? — La Push é a pequena reserva indígena na
costa.
— Não.
— Ele costumava ir pescar conosco no verão. — Charlie ofereceu ajuda.
Isso explicaria porque eu não lembrava dele. Me dou bem em bloquear da minha
memória coisas dolorosas e desnecessárias.
— Ele está numa cadeira de rodas agora — Charlie continuou quando não respondi —
então não pode dirigir mais, por isso se ofereceu para vender a caminhonete bem barato.
— De que ano é? — pude ver pela mudança de expressão que essa era uma pergunta
que ele esperava que eu não fosse fazer.
— Bem, Billy trabalhou bastante no moto - só tem alguns anos.
Esperava que ele não fosse achar que eu desistiria assim tão fácil. — Quando ele
comprou a caminhonete?
— Acho que foi em 1984.
— Era nova quando ele comprou?
— Na verdade, não. Acho que era nova no começo dos anos 60 - ou no fim dos 50, no
máximo. — ele admitiu, envergonhado.
— Ch... pai, não sei muito sobre carros. Não saberia consertar nada se estragasse, e não
poderia pagar um mecânico...
— Realmente, Lali, a coisa anda direito. Não fazem mais carros como aquele.
A coisa, pensei comigo mesma... era uma possibilidade - como apelido, no mínimo.
— Barato é quanto? — afinal, essa era a parte onde eu não podia abrir mão.
— Bem, querida, eu meio que já comprei ele pra você. Um presente de boas-vindas. —
Charlie espiou para o meu lado, com uma expressão esperançosa no rosto.
Uau. De graça.
— Não precisava fazer isso, pai. Eu ia comprar o carro eu mesma.
— Eu não me importo. Quero que você seja feliz aqui. — Ele olhava em frente na
estrada quando falou isso. Charlie não ficava confortável ao expressar suas emoções em
voz alta. Eu herdei isso dele. Então olhava bem pra frente quando respondi.
— Isso foi muito legal, pai, obrigada. Fico muito agradecida. — não precisava adicionar
que eu ser feliz em Forks era uma impossibilidade. Ele não precisava sofrer comigo. E
eu nunca recusaria uma caminhonete de graça.

— Bem, então, de nada. — ele murmurou, envergonhado com o meu agradecimento.
Trocamos mais alguns comentários sobre o tempo, que estava molhado, e era isso em
termos de conversa. Ficamos olhando pela janela em silêncio.
Era lindo, claro, não podia negar isso. Tudo era verde: as árvores, os troncos cobertos de
musgo, os galhos pendurados formando uma cobertura, o chão coberto com plantas. Até
mesmo o ar ficava meio verde ao passar pelas folhas.
Era muito verde - um planeta alienígena.
Finalmente chegamos na casa do Charlie. Ele ainda vivia na casa pequena, de dois
quartos, que ele comprara com minha mãe logo que se casaram. Esse foi o único
período do casamento deles. Ali, estacionada na rua em frente à casa que nunca mudara,
estava minha nova - bem, nova para mim - caminhonete. Era uma cor vermelha
desbotada, com uma grande cabina e enormes calotas. Para minha grande surpresa, eu
amei. Não sabia se ela ia andar, mas conseguia me imaginar dentro dela. Ainda por
cima, era uma daquelas coisas sólidas de ferro, que nunca se amassam - do tipo que se
vê num acidente nem arranhada, circundada pelos pedaços do carro que ela tinha
destruído.
— Uau, pai, adorei! Obrigada! — agora meu dia horrível que seria amanhã iria ser um
pouco menos horroroso. Eu não precisaria escolher entre andar na chuva por mais de
três quilômetros ou aceitar uma carona no carro-patrulha para chegar no colégio.
— Fico feliz que você tenha gostado. — Charlie disse, envergonhado de novo.
Só precisou uma viagem para levar todas as minhas coisas para o andar de cima. Fiquei
com o quarto que tinha janela para o pátio da frente. O quarto me era familiar. Era meu
desde que tinha nascido. O chão de madeira, as paredes azul claro, o teto curvado, as
cortinas de renda já amareladas - tudo isso fez parte da minha infância. As únicas
mudanças que Charlie tinha feito fora por eu ter crescido: mudou o berço por uma cama
e colocou um escrivaninha. A escrivaninha agora tinha um computador de segundamão, com o fio do telefone para a internet grampeada pelo chão até chegar na tomada de
telefone mais próxima. Isso tinha sido estipulado por minha mãe, para que pudéssemos
manter contato fácil. A cadeira de balanço dos meus tempos de bebê ainda estava num
canto.
Havia somente um pequeno banheiro no andar de cima, o qual teria que dividir com
Charlie. Tentava não pensar muito nisso.
Uma das coisas boas sobre Charlie é que ele não fica me cuidando. Ele me deixou
sozinha para desfazer minhas malas e me ajeitar, uma coisa que seria completamente
impossível para minha mãe. Era bom poder estar sozinha e não ter que ficar sorrindo e
parecer feliz. E era um alívio poder olhar com desânimo para a chuva na janela e deixar
escaparem algumas lágrimas. Não estava afim de começar uma choradeira. Guardaria
isso para a hora de dormir, quando fosse pensar na manhã que estava por vir.
A Escola de Forks tinha o aterrorizante total de apenas trezentos e cinquenta e sete -
agora cinquenta e oito - alunos. Só no meu ano, lá em Phoenix, havia mais de setecentos
alunos. Todo mundo aqui tinham crescido juntos - seus avós tinham sido bebês juntos.
Eu seria a garota nova da cidade grande. Uma curiosidade, uma aberração.
Talvez se eu parecesse com uma garota de Phoenix isso poderia ser uma vantagem. Mas
fisicamente eu nunca me encaixaria em lugar algum. Eu deveria ser bronzeada,
esportiva, loira - jogadora de vôlei, ou líder de torcida, talvez - essas coisas associadas
ao vale do sol.
No lugar disso, eu tinha pele branca apesar do sol constante, sem nem ter a desculpa de
ter olhos azuis ou cabelos ruivos. Sempre fora meio magra, mas nem tanto, obviamente
não era atleta. Não tinha a coordenação motora necessária para praticar esportes sem me
humilhar - e machucar a mim mesma ou qualquer um parado muito perto de mim.

fonte : QA

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